segunda-feira, 14 de março de 2011

A existência do principio espiritual é um fato que não tem, por assim dizer, mais necessidade de demonstração que o princípio material; é de alguma sorte uma verdade axiomática: afirma-se por seus efeitos, como a matéria por aqueles que lhes são próprios.

Segundo o princípio: "Todo efeito tendo uma causa, todo efeito inteligente deve ter uma causa inteligente," não há ninguém que não faça a diferença entre o movimento mecânico de um sino agitado pelo vento, e o movimento desse mesmo sino destinado a dar um sinal, uma advertência, atestando, por isso mesmo, um pensamento, uma intenção. Ora, como a ninguém pode vir a idéia de atribuir o pensamento à matéria do sino, disso se conclui que está movido por uma inteligência à qual serve de instrumento para se manifestar.

Pela mesma razão, ninguém tem a idéia de atribuir o pensamento ao corpo de um homem morto. Se o homem vivo pensa, é, pois, que há nele alguma coisa que não há mais quando está morto. A diferença que existe entre ele e o sino, é que a inteligência que faz mover este está fora dele, ao passo que a que faz o homem agir está nele mesmo.

O princípio espiritual é o corolário da existência de Deus; sem esse princípio, Deus não teria razão de ser, porque não se poderia mais conceber a soberana inteligência reinando, durante a eternidade, somente sobre a matéria bruta, que um monarca terrestre não reinando, durante toda a sua vida, senão sobre pedras. Como não se pode admitir Deus sem os atributos essenciais da Divindade: a justiça e a bondade, essas qualidades seriam inúteis se não devessem se exercer senão sobre a matéria.

Por outro lado, não se poderia conceber um Deus soberanamente justo e bom, criando seres inteligentes e sensíveis, para destiná-los ao nada, depois de alguns dias de sofrimentos sem compensações, repassando sua visão dessa sucessão indefinida de seres que nascem sem o ter pedido, pensam um instante para não conhecerem senão a dor, e se extinguem para sempre depois de uma existência efêmera.

Sem a sobrevivência do ser pensante, os sofrimentos da vida seriam, da parte de Deus, uma crueldade sem objetivo. Eis porque o materialismo e o ateísmo são os corolários um do outro; negando a causa, não podem admitir o efeito; negando o efeito, não podem admitir a causa. O materialismo, portanto, é conseqüente consigo mesmo, se não o é com a razão.

A idéia da perpetuidade do ser espiritual é inata no homem; nele está no estado de intuição e de aspiração; compreende que só aí está a compensação às misérias da vida; por isso sempre houve, e sempre haverá, mais espiritualistas que materialistas, e mais deístas que ateus.

À idéia intuitiva e ao poder do raciocínio, o Espiritismo vem acrescentar a sanção dos fatos, a prova material da existência do ser espiritual, de sua sobrevivência, de sua imortalidade e de sua individualidade; ele precisa e define o que este pensamento tinha de vago e de abstrato. Mostra-nos o ser inteligente agindo fora da matéria, seja depois, seja durante a vida do corpo.

O principio espiritual e o principio vital são uma só e a mesma coisa?

Partindo, como sempre, da observação dos fatos, diremos que, se o principio vital fosse inseparável do principio inteligente, não haveria aí qualquer razão para confundi-los; mas, uma vez que se vêem seres que vivem e não pensam, como as plantas; corpos humanos serem ainda animados de vida orgânica, quando neles não existe nenhuma manifestação do pensamento; que se produzem no ser vivo movimentos vitais independentes de todo ato de vontade; que durante o sono a vida orgânica está em toda a sua atividade, ao passo que a vida intelectual não se manifesta por nenhum sinal exterior; há lugar para se admitir que a vida orgânica reside num principio inerente à matéria, independente da vida espiritual que é inerente ao Espírito. Desde então, que a matéria tem uma vitalidade independente do Espírito, e que o Espírito tem uma vitalidade independente da matéria, torna-se evidente que esta dupla vitalidade repousa sobre dois princípios diferentes.

O principio espiritual teria sua fonte no elemento cósmico universal? Não seria senão uma transformação, um modo de existência desse elemento, como a luz, a eletricidade, o calor, etc.?

Se assim fosse, o principio espiritual sofreria as vicissitudes da matéria; extinguir-se-ia pela desagregação como o principio vital; o ser inteligente não teria senão uma existência momentânea como o corpo, e na morte reentraria no nada, ou, o que vem a ser o mesmo, no todo universal; isto seria, numa palavra, a sanção das doutrinas materialistas.

As propriedades "sui generis" que são reconhecidas no principio espiritual provam que ele tem a sua existência própria, independente, uma vez que, se tivesse a sua origem na matéria, não teria essas propriedades. Uma vez que a inteligência e o pensamento não podem ser atributos da matéria, chega-se a esta conclusão, remontando dos efeitos à causa, que o elemento material e o elemento espiritual são os dois princípios constitutivos do Universo. O elemento espiritual individualizado constitui os seres chamados Espíritos, como o elemento material individualizado constitui os diferentes corpos da Natureza, orgânicos e inorgânicos.

Sendo admitido o ser espiritual, e sua fonte não podendo estar na matéria, qual é a sua origem, o seu ponto de partida?

Aqui, os meios de investigação fazem absolutamente falta, como em tudo o que se prende ao principio das coisas. O homem não pode constatar senão o que existe; sobre todo o resto, não pode emitir senão hipóteses; e seja que esse conhecimento ultrapasse a capacidade de sua inteligência atual, seja que há para ele inutilidade ou inconveniência em possuí-lo para o momento, Deus não lhe dá, mesmo pela revelação.

O que Deus lhe faz dizer, pelos seus mensageiros, e o que, aliás, o homem poderia deduzir, ele mesmo, do principio da soberana justiça, que é um dos atributos essenciais da Divindade, é que todos têm um mesmo ponto de partida; que todos são criados simples e ignorantes, com uma igual aptidão para progredir pela sua atividade individual; que todos atingirão o grau de perfeição compatível com a criatura pelos seus esforços pessoais; que todos, sendo filhos de um mesmo Pai, são o objeto de uma igual solicitude; que não há nenhum mais favorecido ou melhor dotado que os outros, e dispensado do trabalho que seria imposto a outros para alcançar o objetivo.

Ao mesmo tempo em que Deus criou mundos materiais de toda a eternidade, igualmente criou seres espirituais de toda a eternidade; sem isso, os mundos materiais estariam sem objetivo. Conceber-se-ia antes os seres espirituais sem os mundos materiais, que estes últimos sem os seres espirituais. São os mundos materiais que devem fornecer aos seres espirituais os elementos da atividade para o desenvolvimento de sua inteligência.

O progresso é a condição normal dos seres espirituais, e a perfeição relativa o objetivo que devem alcançar; ora, Deus tendo criado de toda a eternidade, e criando sem cessar, de toda a eternidade também terá havido os que alcançaram o ponto culminante da escala.

Antes que a Terra existisse, mundos haviam sucedido os mundos, e quando a Terra saiu do caos dos elementos, o espaço estava povoado de seres espirituais, em todos os graus de adiantamento, desde aqueles que nasciam para a vida, até aqueles que, de toda a eternidade, tomaram lugar entre os puros Espíritos, vulgarmente chamados anjos.





Divórcio, edificação adiada, resto a pagar no balanço do espírito devedor. Isso geralmente porque um dos cônjuges, sócio na firma do casamento, veio a esquecer que os direitos na instituição doméstica somam deveres iguais.

A Doutrina Espírita elucida claramente o problema do lar, definindo responsabilidades e entremostrando os remanescentes do trabalho a fazer, segundo os compromissos anteriores em que marido e mulher assinaram contrato de serviço, antes da reencarnação.

Dois espíritos sob o aguilhão do remorso ou tangidos pelas exigências da evolução, ambos portando necessidades e débitos, combinam encontro ou reencontro no matrimônio, convencidos de que a união esponsalícia é, sobretudo, programa de obrigações regenerativas.

Reincorporados, porém, na veste física, se deixam embair pelas ilusões de antigos preconceitos da convenção social humana ou pelas hipnoses do desejo e passam ao território da responsabilidade matrimonial, quais sonâmbulos sorridentes, acreditando em felicidade de fantasia como as crianças admitem a solidez dos pequeninos castelos de papelão.

Surgem, no entanto, as realidades que sacodem a consciência.

Esposo e esposa reconhecem para logo que não são os donos exclusivos da empresa.

Sogro e sogra, cunhados e tutores consangüíneos são também sócios comanditários, cobrando os juros do capital afetivo que emprestaram, e os filhos vão aparecendo na feição de interessados no ajuste, reclamando cotas de sacrifício.

O tempo que durante o noivado era todo empregado no montante dos sonhos, passa a ser rigorosamente dividido entre deveres e pagamentos, previsões e apreensões, lutas e disciplinas e os cônjuges desprevenidos de conhecimento elevado, começam a experimentar fadiga e desânimo, quanto mais se lhes torna necessária a confiança recíproca para que o estabelecimento doméstico produza rendimento de valores substanciais em favor do mundo e da vida do espírito.

Descobrem, por fim, que amar não é apenas fantasiar, mas acima de tudo, construir. E construir pede não somente plano e esperança, mas também suor e por vezes aflição e lágrimas.

Auxiliemos, na Terra, a compreensão do casamento como sendo um consórcio de realizações e concessões mútuas, cuja falência é preciso evitar.

Divulguemos o princípio da reencarnação e da responsabilidade individual para que os lares formados atendam à missão a que se destinam.

Compreendamos os irmãos que não puderam evitar o divórcio porquanto ignoramos qual seria a nossa conduta em lugar deles, nos obstáculos e sofrimentos com que foram defrontados, mas interpretemos o matrimônio por sociedade venerável de interesses da alma perante Deus.